O que tem acontecido com a nossa democracia
Impeachment de Presidente da República, cassação do presidente da Câmara dos Deputados, presidente do Senado Federal tornado réu no STF, ex-presidente e liderança mundial tornado réu e exposto a acusações de corrupção, um “Fora Temer” que ganha amplitude, ministros vêm e vão, presidente e dirigentes de empreiteiras presos, delações, ocupações de espaços públicos como forma de protesto, tudo isso constitui apenas a ponta do iceberg de um sistema político falido demandando, urgentemente, uma repactuação social.
A crise pela qual tem passado muitas das democracias desde fins do século XX chama a atenção por causa de alguns aspectos fundamentais: ela não é uma crise de mudança de regime; ela é consequência dos fracassos que as alternativas dos governos de esquerda representavam; ela é institucional-representativa; de lideranças; de responsividade.
O presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ) falou que o parlamento não poderia estar exposto às pressões que vem de fora da casa. Essa frase não poderia espelhar melhor a condição de redoma na qual vivem a grande maioria dos políticos. Propostas de alto impacto social pretendem ser implementadas sem debates, propostas de iniciativa popular são descaracterizadas, a repressão aumenta e o diálogo diminui, o sacrifício de todos pensado como solução não é submetido aos demais poderes e classes sociais, o corporativismo se fortalece.
O cenário reclama por líderes, mas não aventureiros como tem ocorrido mundo afora pretendendo retroagirem as democracias de deus países a modelos nacionalistas, xenofóbicos e protecionistas, e sim de lideranças que compartilhem e fortaleçam as instituições democráticas, sem as quais, aliás, os direitos elementares de igualdade e liberdade não podem existir substantivamente.
A roda social, com seus valores, aspirações e demandas tem girado numa velocidade que a elite política não consegue acompanhar, muito menos dirigir. Aprendemos, a um alto custo, que a saída para tal dilema não passa por fechamento e autoritarismo, e sim pela abertura, pelo diálogo, pelo consenso e responsabilidade. A democracia e seus dirigentes precisam, urgentemente, canalizar, institucionalizar e legitimar os múltiplos espaços participativos surgidos, afim de que possamos evitar uma depressão democrática mais profunda.
Publicado em Zero Hora, em 03 de dezembro de 2016.